Capítulo 08 - Maid Sádica
Kurone pensou que o colchão do seu quarto continha algum tipo de poder estranho de saltar o tempo. A janela no fim do corredor era iluminada pela luz da lua, e também mostrava que se passara algum tempo desde que Edgar acompanhou-o até o quarto.
“Por quanto tempo será que eu dormi?”
O corpo cansado sucumbiu ao conforto do colchão e adormeceu no mesmo instante que tocou o edredom caro, nem mesmo o próprio Kurone percebeu o momento em que fechou os seus olhos e pegou no sono. Foi desperto então pelo barulho de alguém batendo na porta no meio da noite. “Ainda tô dormindo e isso aqui é um daqueles sonhos safados?”
Na frente do jovem — cambaleando de sono —, estava a bela empregada de cabelos ruivos conhecida mais cedo: Brain. Tudo o que a garota usava era uma camisola semitransparente branca, tornando-a mais sensual do que quando a viu pela primeira vez.
Seus cabelos eram iluminados pela fraca luz da lua prateada, que adentrava pela janela ao fim do corredor, realçando ainda mais a sua beleza.
As mãos delicadas seguravam uma bandeja com duas xícaras — o conteúdo era um líquido quente, que fumegava e exalava um aroma agradável, lembrando o chá-preto que tanto tomava nas lanchonetes do Japão.
Enfim, inevitavelmente, os olhos de Kurone encontraram-se com o seu ponto fraco e logo desviaram-se, voltando a concentrar-se nos cabelos ruivos refletindo o luar.
Tire as crianças da sala, pois falaremos de fetiche.
Desde sempre o ponto fraco do jovem foi algo bem intrigante: ele tinha uma tara por coxas grossas, tentava sempre evitar olhar para baixo enquanto via uma garota do outro lado da rua, caso os seus olhos se encontrassem com essas partes que o excitavam, seria difícil focar novamente em quem estava à sua frente.
Essa tara desviava sua atenção do mundo tanto quanto a “Síndrome do Pensamento Acelerado”. Quantas vezes apanhou da senhorita Kanade, nos dias quentes, quando ela vestia uma saia curta?
— Posso entrar? — Brain perguntou, confusa, não percebendo a luta interna do jovem tentando controlar os seus desejos carnais, mas, no fundo dos seus olhos, dava para notar a intenção maliciosa da garota.
“Velha enrugada, gordo suado, peitos caídos.” Era o mantra ensinado pela psicóloga de coxas grossas.
— C-claro! — Kurone, após recuperar seus sentidos, gritou ao puxar a porta com toda força e apontar para o interior do quarto.
Brain adentrou o local olhando ao redor, à procura de algo, até que sua atenção foi direcionada para a pequena mesa de madeira marrom, onde ela acomodou a bandeja com as xícaras fumegantes.
— Está um pouco quente, por isso vamos ter que esperar um momento.
— C-certo!
— Atrapalhei o seu sono?
— C-claro que não!
— Tudo bem mesmo com você? O seu rosto está completamente vermelho… — A empregada tentou aproximar-se do jovem, para medir a sua temperatura, porém este se afastava. Tentou aproximar-se novamente dele, cada aproximação fazia com que os seios modestos de Brain dessem voltas e pulassem para cima e para baixo, fazendo com que o rosto de Kurone se tornasse ainda mais vermelho.
Ficou claro, apesar da expressão inocente, ela fazia isso de propósito.
— O-o-o chá! Vamos tomar enquanto tá quente! — gritou enquanto ia em direção da pequena mesa. Era uma tentativa de se afastar da empregada, uma tentação ambulante.
— Está gostando do quarto? — Brain passou a xícara para o jovem com as mãos trêmulas.
Em sua cabeça, ele podia escutar a palpitação do próprio coração e o rosto arder a cada segundo, isso era comum para um virgem que viveu tantos anos isolado e nunca teve uma garota bonita em seu quarto. Claro, seria criminoso mencionar suas irmãs nesse contexto, elas, vez ou outra, invadiam seu quarto quando tinham pesadelos.
Kurone engoliu o chá de uma vez em um “glup” audível, não se importou nem mesmo com a temperatura da bebida.
Isso foi um erro, o líquido quente parecia rasgar a garganta, mas o jovem foi forte e resistiu a vontade de cuspir — seria algo rude da sua parte, considerando que, provavelmente, fora Brain quem preparou a bebida.
— Bebeu tudo de uma vez! — a garota gritou em tom de preocupação, vendo Kurone sofrer por conta da sua ação imprudente.
— Tudo bem… Cof cof… Tudo bem! — O jovem sentou-se na cama para amenizar a dor que aflorava no peito. O chá fez o sono, com quem lutava bravamente até poucos minutos, retornar com toda a sua força.
O garoto não conseguia manter os olhos abertos, parecia que a bebida drenou toda a sua força, como o colchão confortável da cama. — Eu não tô nada bem… — resmungou, enquanto caía da cama para o tapete.
Sua consciência esvaiu-se, a sua última visão foi a empregada bonita derramando todo o conteúdo de sua xícara no vaso da planta próxima à cama, com um sorriso diabólico estampado no rosto.
“Eu morri de novo?”, pensou ao abrir os olhos e ver nada além do breu à sua frente.
Em toda a parte, reinava a escuridão. “Que idiota morre depois engolir chá quente?!” Kurone riu da própria incompetência, ou pelo menos tentou formar um sorriso no seu rosto, mas algo o impediu.
Na tentativa de tirar o que quer que fosse da sua boca, percebeu que não podia movimentar o braço esquerdo — e muito menos o direito. Os pés estavam na mesma situação, os únicos órgãos que obedeciam eram seus glóbulos oculares, mas eram inúteis devido à falta de luz.
Repentinamente, uma tocha acendeu-se. Outra luz, repetindo o feito de sua companheira, também iluminou uma parte do local. Mais outra, outra... outra... outra... e, assim, como em um efeito dominó, toda a sala clareou-se.
— Urghhhhh! — Kurone tentou gritar, porém a mordaça impedia-o.
As algemas presas por correntes na cadeira de madeira limitavam os movimentos. Correntes novamente... sua última experiência lhe deu uma noção de quão resistente era o aço desse mundo — precisaria de um fuzil e uma loli delinquente para quebrá-las.
— Urghhh!
Alguém aproximava-se, era a silhueta de um corpo esbelto e jovem, que ao tomar forma, mostrou-se ser a beldade com quem teve o prazer de tomar uma xícara de chá quente.
— Urghhhhh! — Tentou debater-se e gritar, em busca da ajuda da garota vestida em um uniforme de empregada.
— Não faça barulho, isso não vai adiantar e você só vai acabar se machucando — disse a garota, sem demonstrar nenhum indício que ajudaria o jovem acorrentado.
— Ohhhh, então, já despertou? Alegro-me, finalmente podemos iniciar nosso interrogatório. — As palavras rebuscadas e o tom calmo só podiam pertencer a uma pessoa... quem acabava de adentrar na sala era ninguém menos que o anfitrião, o homem que ofereceu um jantar delicioso a Kurone: o marquês Edward Soul Za.
Ao perceber o que estava acontecendo, riu de sua inocência.
Devia ter suspeitado da cortesia de Edward, ele recebeu dois invasores em sua mansão, deu comida e um quarto confortável para ambos e não fez nenhum questionamento além de perguntar de onde eles vieram. O nobre aceitou uma história inventada por Kurone, sem questionar muito — isso era, no mínimo, suspeito.
A boca amordaçada foi liberta pelo nobre. Isso repleto de saliva era uma daquelas “mordaças com bola” que os masoquistas usavam? Devia existir algo como isso em um mundo de espadas e magia?
— Não grite — Edward sussurrou no ouvido do garoto um aviso inútil.
— SOCOROOOOOOO!
— Ahhh… como é teimoso, se gritar novamente, terei que amordaçar-te.
— Tsc! — Sem outra escolha, Kurone decidiu manter-se em silêncio, na esperança de seu grito ter sido o suficiente para alcançar por sua pequena companheira, isso se ela também não tivesse sido aprisionada em outro cômodo.
“Impossível, a Rory é uma trapaceira desgraçada.” O jovem decidiu acreditar que a garotinha viria lhe resgatar, mas começou a ficar preocupado ao lembrar da personalidade dela, era mais fácil a menina simplesmente detonar uma parede e fugir da mansão, deixando-o para trás.
— Não adianta, creio que o senhor mesmo deve ter percebido como a cama do quarto é confortável… — Edward falou, como se estivesse lendo os pensamentos do jovem.
“Como eles conseguem fazer isso?” A fala de Edward fez com que a última chama de esperança de Kurone se apagasse.
Não era apenas a sua impressão, a cama confortável tinha algum tipo de feitiço de sonolência, não importava o quanto tentasse resistir, era difícil acordar após deitar nela.
Se Rory também tomou o mesmo chá, ela, certamente, não acordaria mais nessa noite. “Droga!”, gritou internamente, mostrando uma expressão hostil ao marquês e a empregada ao seu lado.
— Não culpe a Brain por isso, ela apenas seguiu minhas ordens, como uma serviçal fiel cumprindo seu contrato, certamente essa não era a vontade dela.
Silêncio. O garoto cerrou os olhos.
— Agora que o senhor já se acalmou, podemos começar o interrogatório! — Embora dito em tom calmo, as palavras de Edward soaram de maneira assustadora na mente de Kurone, e o que mais o assustou foi o objeto nas mãos da empregada.
Clap! Um açoite de teste fez um buraco fundo na parede
— Ahhhhhh!
— O jovem arregalou os olhos ao ver a empregada de cabelos ruivos segurando o chicote negro e sorrindo de maneira suspeita.
Com certeza, aquele não seria um interrogatório pacífico.
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